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A PAZ HONROSA - REVOLUÇÃO FARROUPILHA

Acampamento da Carolina, nos campos do Ponche Verde,
na cidade de Dom Pedrito.

SANDRA JATAHY PESAVENTO
 A REVOLUÇÃO FARROUPILHA
 3ª edição Editora Brasiliense
A "paz honrosa"

A assinatura da Paz de Ponche Verde, a 28 de fevereiro de 1845, nos campos de Dom Pedrito, em plena campanha gaúcha, teve um significado ideológico fundamental para a imagem do movimento, que foi guardado pelas gerações futuras e habilmente explorado pela historiografia oficial. Os farrapos não sofreram uma derrota final nos campos de batalha, apesar de se encontrarem já bastante desgastados. 


  
Obelisco da Paz Farroupilha

Além disso, foi-lhes oferecida uma "paz honrosa", que atendia aos revoltosos em muitas das suas antigas reivindicações. Foi concedido aos es-tancieiros gaúchos o direito de escolherem o seu presidente de província; as dividas da República Rio-grandense seriam pagas pelo governo central; os generais farrapos poderiam, se o quisessem, passar para o exército brasileiro com os mesmos postos que ocupavam nas forças rebeldes; o governo central garantia o direito de propriedade e a segurança individual de todos os revolucionários; os prisioneiros de guerra seriam soltos, e aqueles que estivessem fora da província poderiam retornar sem receio; seria elevada em 25% a taxa alfandegária sobre a entrada do charque platino no mercado brasileiro; o governo reconheceria a liberdade dos escravos que haviam servido na revolução como soldados. 

  


Todavia, o atendimento às reivindicações dos estancieiros tinha um intencionalidade muito clara e relacionada com os rumos que tomavam as disputas políticas no Prata. Na Argentina, processava-se o conflito entre as forças representadas pela oligarquia rural (Rosas) contra a burguesia comercial, aliada da Inglaterra. No Uruguai, por instigação e apoio de Rosas, Manoel Oribe vencera as forças de Frutuoso Rivera, na intenção de levar o país ao domínio argentino. Para fazer frente aos conflitos que se avizinhavam, o Império tinha necessidade do apoio militar e econômico do Rio Grande do Sul, bem como do uso de seu território como base de operações, daí o oferecimento da "paz honrosa" que satisfizesse os rebeldes. Entrava mais uma vez em cena, como elemento de barganha, o "poder militar" da província. Como se viu, segundo as disposições do Tratado de Paz, os rio-grandenses teriam o direito de escolher naquele momento o seu presidente de província, sendo atendida antiga reivindicação local. 

 


A força ideológica da "paz honrosa" foi tão grande que os pecuaristas escolheram o próprio Caxias... Após a revolução, iniciou-se um período de apogeu da dominação local dos pecuaristas, acompanhado de um surto favorável para a sua economia, tanto em função dos acertos entre o centro e a província quanto pelas perturbações da economia concorrente platina. Após a independência do Uruguai, em 1828, começara o reerguimento dos saladeros da região. O bloqueio imposto a Buenos Aires, pela esquadra francesa, fez com que Montevidéu se tornasse o eixo das operações comerciais platinas e que aumentasse a influência inglesa na região. Como decorrência desta situação, foi introduzida no Uruguai a máquina a vapor na produção de carnes, possibilitando a exploração de outros subprodutos, como a graxa. Por outro lado, os saladeros passaram a concentrar-se no litoral, junto ao local de embarque da produção, ocasionando o barateamento desta e a introdução de melhorias sanitárias, como a canalização dos resíduos diretamente para o mar. Entretanto, esse surto de prosperidade foi interrompido pela eclosão de conflitos armados na região, entre as forças de Oribe (Uruguai) e Rosas (Argentina) contra o Brasil, aliado a Urquiza, governador de Entre-Rios, e ao chefe uruguaio Artigas. Durante o conflito, mais uma vez o gado uruguaio foi contrabandeado para as charqueadas gaúchas. O Tratado de 1851, que assinalou a derrota de Oribe, estabeleceu que os rebanhos uruguaios não pagariam imposto para entrar no Brasil, ao passo que o charque platino seria onerado com taxas de importação nos mercados brasileiros. Tal disposição acabava por sedimentar a desorganização dos saladeros platinos, beneficiando as charqueadas gaúchas com a livre entrada de matéria-prima e com as dificuldades impostas ao produto concorrente nos mercados do país. Dentro destas condições específicas, marcadas pela desorganização da economia saladera platina e pelas possibilidades de barganhar com o governo central face aos conflitos de fronteira, a charqueada rio-grandense teve relativas condições de prosperar. Localmente, o novo equilíbrio de forças haveria de reverter em benefício da oligarquia sulina, constituída de estancieiros, charqueadores e exportadores. 

 


Dominando de forma inconteste a sociedade sulina, conjunturalmente, até cerca de 1870, minimizaram-se as tensões existentes nas relações entre o centro e a província. No plano das consciências, atenuavam-se os efeitos da submissão política e econômica da região à Corte. Na medida em que, nas décadas de 60 e 70, restabeleceram-se as condições de concorrência das charqueadas uruguaias, operando agora como empresas capitalistas e que, com o fim da guerra do Paraguai, em 1870, findaram os conflitos de fronteira no Sul, passou novamente a província a sentir-se oprimida pelo Centro. Sem outros fatores com que barganhar, o Rio Grande do Sul tentaria, até o final do Império, reconstituir um novo equilíbrio de forças com o Centro.


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