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A MULHER NA GUERRA DOS FARRAPOS



HILDA AGNES FLORES

Sintese do discurso de posse como Membro Efetivo do Instituto Histórico e Geográfico do Rio Grande do Sul, no dia 9 de outubro de 2014, em resposta à saudação proferida pelo Prof. Luiz Osvaldo Leite. 

A guerra intestina dos Farrapos lutou por ideias, difíceis de conciliar. Alongou-se por quase um decênio (1835-1845), destruindo a economia da Província e desorganizando a sociedade. Famílias sem o chefe mantenedor colocaram a mulher face a uma nova realidade, induzindo-a a agilizar o que Michele Perrot chama de “poder possível” na busca do caminho para enfrentar imprevistos e provocativos desafios. Audaciosa e inovadora, a mulher projetou-se à frente de seu tempo, à semelhança da mulher europeia que décadas mais tarde enfrentaria incríveis desafios de duas grandes guerras mundiais, concretizando o feminismo esboçado pela mulher farroupilha. Documentos amarelados de nossos arquivos, noticioso da imprensa nascitura, depoimentos do Processo dos Farrapos e dos viajantes europeus que aqui estiveram no período farroupilha revelam que, acuada, a mulher exerceu potencialidades até então adormecidas, no afã de salvaguardar os filhos e a propriedade. 
 
De habilidades várias, cada qual respondeu ao desafio a sua maneira, dentro de seus talentos. Juntas elaboraram o que hoje se reconhece como pré-feminismo, não formando escola porque a mulher, minoritária e de pouca cultura, devolveu administração ao filho crescido e auxiliou na reconstrução da pátria arrasada. Assim, ordenando fontes e fatos, encontramos diversos grupos: 

* As escravas, executoras de toda sorte de tarefas, urbanas ou rurais, constituíram força industriosa na construção e ordenação de recursos alimentícios ou bélicos, chegando a pegar em armas. A documentação tanto informa sobre valor monetário de escravos/escravas como sobre suas diferentes atribuições ocupacionais. * 
 
Mulheres gaúchas na luta armada.
As guerreiras: foram as mulheres que acompanhavam seu homem para a guerra, como as índias guaranis, que levavam os filhos. 
 
O soldado amasiado, ao final da guerra ou levava a índia para casa, ou abandonava a amásia que a família rejeitara, ou deixava-se ficar com ela e as crias, concorrendo para a miscigenação. Houve projeto de um “partido político feminino”, com Maria Josefa Fontoura e outras líderes, criticadas e ironizadas. E Anita Garibaldi, foi “guerreira de dois mundos” ou mitificada como tal? 


* Costureiras do exército: Conde de Caxias em 1842 veio para o Sul com poder pleno do Imperador, para terminar com a guerra que já durava oito anos. Formou um exército de 12 mil homens para vencer os farrapos que lutavam sem aquartelamento. Ao Arsenal da Guerra pediu 12 mil uniformes. Naqueles tempos a costura constava nas “prendas domésticas” ensinadas às mocinhas para confeccionarem seu enxoval. Na guerra civil todas, profissionais ou amadoras, legalistas ou farroupilhas, podiam se inserir na tarefa do Arsenal, que pagava por peça. Ganho pouco mas bem vindo em tempos bicudos de guerra. Costurava-se à mão, ponto por ponto. Isaac Singer, mecânico de Nova York, patenteou sua máquina de costura só em 1851. O Semanário Oficial de Porto Alegre dá conta de centenas de peças de tecido, junto com tesouras e 30 mil agulhas que o comércio movimentava! *
 
Casal estancieiros da Vacaria
 As estancieiras. Eram poucas em número, mas importantes por administrarem, no decorrer da guerra, em lugar dos maridos tombados. As fazendas de criação forneciam gado muar e equino para deslocamento e alimentação da tropa, e para pagamento de armas e munições vindas de Montevideu. Espoliadas umas, outras defenderam seus direitos. Olinda de Freitas, viúva de José Antonio de Freitas, só liberava animais mediante recibo assinado. Com firmeza, sustentou querelas com os estancieiros Meireles, primos de Bento Gonçalves, tendo sido a mulher indenizada com maior valor no pós-guerra: 4:414$760 rs, semelhante ao valor pago a Bento Gonçalves. Bernardina Barcelos de Almeida, esposa do ministro Domingos J. de Almeida, administrou a fazenda, a charqueada e a casa de exportação em Pelotas, onde em plena guerra abriu escola para os filhos e crianças vizinhas.


HILDA AGNES FLORES - Mulheres na Guerra dos Farrapos





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